top of page
  • Foto do escritorRepórter Guará

Buena Vista, um bairro recém-nascido e cheio de histórias

A região dividida em Buena Vista I, II, III e IV é umas das maiores de Goiânia com habitações populares. Subsidiadas pelo governo, essas habitações abrigam milhares de pessoas com histórias diversas que tinham algo em comum: o sonho da casa própria


Texto e Imagens: Heloisa Sousa


Avenida Pôrto Salinas, uma das principais avenidas do Buena Vista I.

Urias Pinto Cunha, conhecida no setor como dona Urias, ajeita as fotos de família e os cadernos de receita na gaveta da sala. Ela parece viajar a um canto diferente da memória a cada pergunta minha. “Eu gosto de morar aqui”, comenta enquanto folheia um dos cadernos em sua casa. A aposentada de 78 anos foi umas das beneficiadas pelo programa “Minha Casa Minha Vida” (PMCMV) em 2013. Ela conta que seu sonho era ganhar uma casa desde que se mudou de Belém para a capital goiana. Viúva há três meses, e os olhos ficam marejados ao se lembrar da presença do marido na casa, dona Urias passa quase toda a semana na casa da filha, no setor Vila Itatiaia. Era lá onde morava antes de ter sua casa própria, onde pagava de aluguel aproximadamente 13 vezes o valor que paga hoje na mensalidade do apartamento. Mas, desde que o marido faleceu e o sobrinho se mudou depois de se casar, a casa ficou mais vazia e ela prefere ir fazer companhia à filha.


A mensalidade paga por dona Urias é um valor simbólico pago todos os meses do período de 2013 até 2023 e corresponde a 5% da renda bruta de cada proprietário. O programa “Minha Casa Minha Vida” foi lançado pelo governo federal em 2009, durante o mandato do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva. Aproximadamente 1 milhão de habitações foram entregues em 2014 e, entre esses milhões, estão alguns dos moradores do setor Residencial Buena Vista I. O bairro se localiza na periferia da Região Oeste de Goiânia, tem 10 anos de existência e é dividido em Buena Vista I, II, III e IV. Segundo a última pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2010, a região somava um total de 2.292 pessoas. Mas, com a chegada de novos moradores nesses últimos oito anos, é possível que esse número tenha dobrado.


Cida e seu marido, Ilson.

Aparecida de Fátima de Sousa tem 57 anos e mora com o marido, Ilson Gonçalves. A maioria dos apartamentos do condomínio Osmar Rodrigues, onde dona Urias e Aparecida (ou Cida) são vizinhas já tem interferências de obras feitas pelos próprios moradores, o apartamento delas não é diferente. A varanda com diversidade de plantas, que é uma extensão feita na casa depois de já entregue e uma realização para Cida e seu marido, é onde ela me recebe para me contar sua história. “Eu morava de aluguel e foi uma emoção grande quando eu fui sorteada. Lá, a gente pagava aluguel caro e aqui a prestação é barata. É bom para a gente que é de baixa renda. Eu adoro aqui”. Cida tem apenas uma reclamação: a falta de serviços no setor. “A gente tem que sair para longe para pagar as contas”, comenta. Essa é uma reclamação frequente dos moradores, como, por exemplo, de Vandeir de Oliveira.


Vandeir é conhecido no condomínio como Serralheiro, pois é essa sua profissão. Ele mora com a esposa, Juliana de Oliveira, e com os dois filhos adolescentes. Juliana fica durante quase toda a entrevista na cozinha, prefere a voz do marido no gravador. Serralheiro conta que, apesar de ter ficado feliz por ter sido contemplado com um apartamento, preferia uma casa, pois assim haveria espaço para montar sua própria serralheria. “Não era o que a gente esperava, mas a gente achou bom. A casa era melhor porque teria mais privacidade”, completou. No decorrer da entrevista Juliana vai até a sala e ajuda o marido a responder algumas perguntas, é como se sentisse a necessidade de participar, de contar a história do qual ela também faz parte. “A gente se sentiu na obrigação de vir. Porque a gente fez a inscrição e lutou mais de quatro anos”, conta Juliana. O PMCMV construiu condomínios verticais, pois apartamentos otimizariam os espaços, diferente das casas que ocupavam uma maior quantidade de terra por família.


Serralheiro e a esposa, Juliana.

“Ganhar o apartamento foi bom, mas eles só tiraram o pessoal de um local e jogaram em outro, porque não deram benefícios como escola, lotérica, batalhão de polícia, creches. Antigamente, se um cachorro fizesse xixi no poste, a energia caía. Hoje, eles melhoraram isso, mas tem como melhorar mais”, diz Serralheiro. Segundo ele, o setor está abandonado e, por isso, existe ainda muita insegurança. Essa é realmente a sensação que o lugar passa, com vários terrenos baldios com mato alto e as grades dos condomínios com buracos grandes suficientes para entrar uma pessoa. Mas Oneir Lopes de Matos, outra moradora do condomínio, acredita que houve uma melhoria nesse sentido desde que se mudou para o Buena Vista.


Oneir mora com o marido e dois filhos. Depois que terminou seu primeiro casamento, ela se viu obrigada a sair de sua cidade natal, Porto Nacional, e se mudar para Goiânia. “Eu vim para trabalhar. Morei de favor durante muito tempo e eu era muito humilhada. Até que Deus conseguiu me dar essa casinha aqui, mas demorou”. Ela faz alguns bicos como faxineira, mas conta mesmo com a aposentadoria do marido, que é deficiente. “A gente tinha Bolsa Família, mas aí cortou com esse presidente Temer. Então, eu consegui fazer o Renda Cidadã que é assim: se você tem um salário mínimo de deficiente, aí você ganha”, conta Oneir. Sentada perto da portaria com outra moradora, ela transpassa tranquilidade, “Eu gosto daqui, acho muito bonito”, diz depois de contemplar durante alguns segundos de silêncio o lugar onde mora.


Condomínio Osmar Rodrigues.

Cada casa diz muito sobre cada morador. Cada cantinho conta uma história. Desde a casa de dona Urias, com muitos retratos dos familiares e símbolos religiosos, passando pela casa rica em plantas da Cida até a casa do Serralheiro, com os cachorros recém-nascidos assim como o setor Buena Vista. O setor trouxe pessoas de diversos lugares do estado com o PMCMV, que tinha como objetivo distribuir moradias populares e facilitar a aquisição de imóveis pela população de baixa renda, assim aconteceu. Todo lugar com pessoas é um lugar com grandes histórias e no Buena Vista não poderia ser diferente.

0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Era o mar

bottom of page